Salário Mínimo: a valorização deve continuar
Salário
Mínimo: a valorização deve continuar
Clemente Ganz Lúcio[1]
O salário mínimo
(SM) foi instituído no Brasil na Constituição de 1934, a fim de garantir aos
trabalhadores condições de satisfazer suas necessidades de sobrevivência. A
Constituição de 1946 determinou que o SM deveria atender também às necessidades
da família do trabalhador e a de 1988 renovou esse direito a todos os
trabalhadores urbanos e rurais, definindo, no artigo 7º, parágrafo IV: um
“salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a
suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação,
educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social,
com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua
vinculação para qualquer fim”.
As Centrais Sindicais organizaram uma
ação nacional com as Marchas da Classe Trabalhadora, a partir de 2004,
mobilizando o movimento sindical para lutas que incluíram a implantação de uma
política de valorização do salário mínimo. O movimento gerou uma complexa negociação
com o governo federal, que resultou, incialmente, em acordo entre as Centrais
Sindicais e o governo Luís Inácio Lula da Silva e, em 2011, em lei.
Os critérios definidos para a valorização do piso nacional foram o
repasse da inflação do período entre as correções, o aumento real pela variação
do PIB (Produto Interno Bruto), além da antecipação da data-base de revisão anualmente,
até ser fixada em janeiro, o que ocorreu em 2010.
Em abril de 2002, o valor do SM era de R$ 200,00. Com a política
de valorização, além da reposição da inflação, o salário mínimo teve aumento
real de 76,57% até janeiro de 2018. Caso esse aumento real não tivesse
ocorrido, o SM, em janeiro/2018, seria de R$ 540,00, o que significa que as
medidas determinadas pela política incrementaram-no em R$ 414,00. Para um
trabalhador que ganha salário mínimo, esse aumento real adicionou cerca de R$
5.400,00 à renda anual, elevando-a para R$ 12.400,00. Sem isso, essa renda seria
de aproximadamente R$ 7.000,00. Ainda é pouco - segundo o DIEESE, o salário
mínimo necessário para uma família de quatro pessoas é quase R$ 3.600,00 -, mas
representa um grande avanço.
A correção
aplicada ao SM em janeiro de 2018 estabeleceu o valor da remuneração em R$
954,00, inferior ao que deveria ter se fosse ajustado de acordo com a regra
vigente, como mostra a Nota Técnica 188, produzida pelo DIEESE (Valor de R$
954,00 não recompõe poder de compra do Salário Mínimo”, disponível em www.dieese.org.br).
Como previsto, levou-se em
conta o resultado do PIB de 2016, que foi negativo (-3,16%), mas não se
obedeceu ao segundo critério - no caso, a inflação de 2017-, correspondente a
2,07%. O valor foi reajustado em 1,81%, a partir da estimativa para 2017 da variação
do INPC-IBGE (Índice Nacional de Preços ao Consumidor/Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística), que mensura o comportamento dos preços para famílias
que ganham até cinco salários mínimos mensais, o que gerou diferença de 0,25%,
que não será corrigida. Situação semelhante já tinha ocorrido em janeiro de
2017, quando o reajuste aplicado sobre o SM foi 0,10% inferior ao INPC.
Assim, nesses dois anos, acumula-se um prejuízo de 0,35% sobre o
valor do piso nacional, o que o elevaria a remuneração, com arredondamento para
cima, a R$ 958,00 em 2018. Faltam, portanto, R$ 4,00 no salário mínimo, o que
representa R$ 52,00 anualmente para cada trabalhador. Levando-se em consideração
as 48 milhões de pessoas que recebem o salário mínimo, isso significa acréscimo
de cerca de R$ 192 milhões por mês ou R$ 2,5 bilhões por ano na massa salarial
e previdenciária. Por mais que individualmente o valor seja pequeno, o dinheiro
pertence aos trabalhadores e, para a economia do país, é um montante importante.
Sem essa reposição, depois de mais de uma década, o salário mínimo volta a
apresentar perda.
A continuidade da política de
valorização do salário mínimo representa um grande desafio. Primeiro, porque precisa
de um ambiente de crescimento econômico. Segundo, porque tem reflexos sobre
toda a economia e exige outras mudanças que precisam ser combinadas e
articuladas para consolidar um novo patamar da base salarial no país. Serão
necessárias disposição, visão de longo prazo, disposição para compromissos e
vontade de celebrar acordos, elementos que o movimento sindical brasileiro
demonstra ter nas lutas e negociações diárias.
[1] Sociólogo, diretor técnico do DIEESE, membro do CDES
– Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.
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