Constituição de 1988: Desafios para a ação sindical vinte anos depois





Constituição de 1988: Desafios para a ação sindical vinte anos depois
  

Clemente Ganz Lúcio[1]


A Constituinte da segunda metade dos anos 80, processo legislativo que elaborou a nova Constituição Federal de 1988, fechou um ciclo político de luta pela superação de mais de duas décadas de regime ditatorial. Inúmeros e variados tipos de movimento sociais emergiram na segunda metade dos anos 70. No campo e na cidade a sociedade civil apresentava-se organizada em defesa de interesses específicos – a luta pela terra no campo, pela moradia na cidade, contra a carestia, pela saúde, creche, transporte coletivo, entre tantas outras organizações e lutas desencadeadas nesse período. Essas diversas lutas propiciaram o surgimento de inúmeras organizações no campo popular e fizeram emergir novas lideranças sociais para a vida política das comunidades e do país.

O movimento sindical foi duramente reprimido desde os primeiros momentos do golpe militar de 1964. Prisão, afastamento, tortura e morte fizeram parte da vida sindical e de milhares de militantes políticos e estudantis. Pouquíssimas eram as brechas que possibilitavam algum tipo de ação sindical, mesmo assim, quando possível, com uma vigilância repressiva ostensiva. A década de 70 inicia-se com o crescimento da taxa de inflação. No ano de 73 o Dieese denuncia um caso de manipulação da variação da inflação. A partir da Pesquisa de Padrão de Vida da classe trabalhadora realizada na cidade de São Paulo o Dieese chegou a uma variação anual de 26,6%, percentual bem acima dos 12,6% oficiais. Esse fato, agregado a insatisfação com o regime militar entre tantos outros motivos que já mobilizavam a sociedade e os trabalhadores, levou o movimento sindical desencadear, a partir do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, uma luta pela reposição salarial. Em 1977 o ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, reconhece o índice de 26,6% como oficial para o ano de 1973. Além da repercussão desse fato na imprensa desde 73 – nunca é bom deixar de lembrar, a imprensa vivia cerceada pela censura – nesse período o Banco Mundial também apontou ambos os índices no seu relatório. Cresce a indignação com a repercussão do problema e com o aumento da carestia promovida pela conjugação do aumento dos preços e a política salarial restritiva que diminuía o poder de compra dos salários.

A aceleração da inflação foi mais um estopim para desencadear no final dos anos 70 uma ampla mobilização sindical pela reposição salarial. Campanhas salariais, negociações coletivas, mobilização sindical passaram a fazer novamente parte do trabalho das entidades sindicais. Estavam dadas as condições para novas mobilizações de trabalhadores, por mais de uma década excluídas da agenda social, e que deram base para o surgimento do que veio chamar-se posteriormente de novo sindicalismo. O movimento sindical volta a ganhar presença social e política em todo país, as lutas se multiplicavam, as oposições sindicais ganhavam força e a vida sindical iniciava um processo de renovação que avançou pelos anos 80. 

Veio a campanha pelas Diretas Já!, mobilização nacional que envolveu amplos setores sociais que buscavam estabelecer a eleição direta para Presidente da República. O resultado foi a transição lenta e gradual e, neste caso, com um “acordão” que elegeu indiretamente Trancredo Neves (presidente, que falece antes de tomar posse) e José Sarney (vice-presidente, que assume a Presidência). Em 1986, o governo de Sarney lança Plano Cruzado, primeiro pacote econômico que tinha por objetivo buscar a estabilização da inflação. Em paralelo crescia a demanda pela promulgação de uma nova Constituição Federal que superasse a Constituição de então, gravemente alterada pelo regime militar. Os movimento sociais, sindicais, estudantis e políticos  propunham a eleição de uma Assembléia Nacional Constituinte, que para muito deveria ser exclusiva, ou seja, ter a única tarefa de elaborar a nova Constituição Federal. Ao final houve a Constituinte – não exclusiva – que em 1998 promulgou a nova Constituição Federal.

Olhando retrospectivamente, a Constituição de 1988 celebra e fecha um ciclo de mobilização popular e social e de grande unidade. Nos anos 80, é bom lembrar também, muitos partidos políticos colocados na clandestinidade voltam à cena e há a criação de novos partidos que passaram a atuar de forma articulada no trabalho constituinte. Poucos foram os momentos futuros de unidade como o experimento naquele processo e com o nível de articulação que se alcançou. É bem provável que a luta pela superação da ditadura, combinada com o propósito constituinte, permitiu um nível especial de cooperação e unidade.

Considerando-se o número extremamente limitado de parlamentares que o campo democrático-popular tinha na Assembléia Constituinte, somada a força que o regime militar ainda tinha na sociedade e as alianças visíveis e invisíveis dos setores conservadores, a Constituinte de 1988 é uma grande obra e uma enorme vitória. 

Em uma recente palestra[2] realizada no Instituto de Economia da Unicamp, Artur Henrique, presidente da CUT – Central Única dos Trabalhadores, sistematizou e destacou alguns dos aspectos que considera como avanços obtidos na Constituição de 1988 em relação aos direitos trabalhistas e sindicais. Esses pontos são:
·      “ Institui uma nova relação entre os Sindicatos e o Estado;
·      Um princípio básico que norteou a Constituição de 1988 foi a auto-organização dos sindicatos que estabelece: (a) a livre criação dos sindicatos, sem a prévia autorização do Estado e (b) liberdade de administração dos sindicatos;
·      Incentivou a negociação coletiva, como melhor forma de solução para uma série de questões relacionadas às relações de trabalho;
·      Outro elemento importante foi a ampliação do direito de greve.  A dimensão deste direito atingia na CF de 1988 um limite nunca antes conhecido, conferindo este direito também aos trabalhadores do serviço público. 
·      OUTRAS MODIFICAÇÕES EXPRESSIVAS:
  • Redução da jornada semanal de 48 horas para 44 horas semanais;
  • Jornada de 6 horas para turnos ininterruptos;
  • Elevação do adicional de horas extras para o mínimo de 50%;
  • Direito a férias remuneradas com incremento de 1/3 na remuneração;
  • Generalização do Regime de FGTS, com a supressão da estabilidade decenal  (item favorável aos interesses do empresariado);
  • Criação de uma indenização prevista para os casos de dispensa arbitrária;
  • Aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, no mínimo de 30 dias;
  • Inclusão, em nível constitucional, de três estabilidades especiais: dirigente sindical; dirigente da CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidente; empregadas gestantes;
  • Piso salarial proporcional à extensão e complexidade do trabalho;
  • Irredutibilidade dos salários;
  • 13º com base na remuneração integral;
  • Proteção dos salários e criminalização de sua retenção;
  • Adicional de remuneração para as atividades penosas, perigosas ou insalubres;
  • Descaracterização da natureza salarial da PLR (flexibilização);
  • Proteção do mercado de trabalho da mulher mediante incentivos (nos termos da lei);
  • Ampliação da licença da gestante para 120 dias;
  • Criação da licença-paternidade, de 5 dias;
  • Reformulação da obrigatoriedade de creches e pré-escolas;
  • Igualdade de direitos entre o trabalhador avulso e o permanente;
  • Proteção contra discriminação para o trabalhador com deficiência;
  • Proteção em face da automação;
  • Retorno da idade mínima de admissão no emprego para 14 anos;
  • Instituição da figura do representante dos trabalhadores nas empresas com mais de 200 empregados”.

Ao longo desses mais de vinte anos muita coisa aconteceu e mudou e parte expressiva do que se estabeleceu na Constituição e que precisava de regulamentação ainda aguarda essa iniciativa. Um exemplo é o direito à negociação coletiva dos servidores públicos, que ganharam o direito à organização sindical sem a regulamentação do direito de negociação. Por outro lado, algumas regulamentações vieram rapidamente, como por exemplo, o regramento do direito de greve. Cabe, portanto, um esforço que não é pequeno de regulamentação infraconstitucional de aspectos colocados na Carta Maior que ainda não foram transformados em Lei.

Nessas duas décadas o país experimento entre 1986 e 1994 inúmeros planos de estabilização econômica que fracassaram gerando expressivas perdas salariais, carestia, insatisfação em relação à política econômica e insegurança política. A eleição direta de 1989 elegeu Fernando Collor Presidente do Brasil. Outro exercício para testar as instituições e processo democrático do país foi a sua destituição. O seu vice assume a Presidência e em 1994 o Presidente Itamar Franco lança o Plano Real que consegue, seguindo tendência internacional, estabilizar e baixar as taxas de inflação. Crises internacionais afetaram gravemente o país gerando instabilidade econômica (as crises do México, Argentina, Japão, Ásia, Rússia), o que, combinado com problemas internos como o apagão de 2001, por exemplo e com a baixa capacidade de investimento do Estado, conduziram por mais de uma década o país a um baixíssimo e oscilante crescimento econômico.

Agravam-se as desigualdades sociais, o desemprego cresce de maneira constante e atinge suas maiores taxas, os salários entram em queda livre no final dos anos 90 até 2003, a taxa de investimento é muito baixa e sem perspectiva de crescimento. Vive-se no país o paradoxo dos limites do PIB potencial: a economia brasileira está fadada a um baixo crescimento porque sua capacidade de atender a uma demanda crescente é muito limitada e com grave pressão inflacionária. O mercado interno não pode crescer para não aumentar a demanda e não gerar pressão inflaconária. Juros altos e câmbio fecham o conjunto de instrumentos de controle da inflação que, depois de 1999, passou para o regime de metas.

Desde 2004 esse cenário vem alterando-se. As desigualdades sociais vêm lentamente diminuindo porque houve um forte incremento da renda dos mais pobres (a) pelas políticas de transferência de renda do Bolsa Família, (b) pela política de valorização do salário mínimo - política esta acordada entre as Centrais Sindicais e o governo federal depois de três grande mobilizações em Brasília, uma em cada ano, em que uma das principais bandeiras era o estabelecimento de uma política de valorização do salário mínimo, (c) bem como o impacto dessa política nos salários mais baixos e nos benefícios e aposentadorias. O destaque especial é o incremento do emprego, em especial o emprego com carteira de trabalho assinada, que vem crescendo nos últimos anos.

A inflação continua sobre controle e baixa, apesar do repique deste ano (2008) por conta das pressões internacionais de produtos comercializáveis (grãos, minérios e petróleo). A taxa de investimento vem crescendo, o comércio internacional obteve ótimos resultados nos últimos anos. A taxa de crescimento mudou de patamar e espera-se para este ano (2008) uma taxa superior a 5,5%. O que parecia uma agenda do passado e não mais parte da modernidade da prevalência do mercado – crescimento, distribuição de renda, diminuição das desigualdades com base no emprego, emprego com proteção social, aumento do investimento, entre outros aspectos – voltou à cena, insistindo em se recolocar como parte do jogo social.

Desse modo, retoma-se no país o debate de uma agenda nacional de desenvolvimento. Cresce a necessidade de projetos (ou de projetos) para o país que estabeleça, por meio do debate político, a relação desejada entre crescimento e perspectiva desenvolvimento para um país que tem simultaneamente um elevado grau de riqueza com base em um parque industrial diversificado e profundas desigualdades regionais e um nível endêmico de pobreza. Os caminhos não são simples e cabem muitas escolhas pela frente.


DESAFIOS PARA A AGENDA SINDICAL FUTURA

O atual ciclo de crescimento econômico experimentado nos últimos 5 anos – desde 2004 – com rebatimentos positivos para o emprego e os salários – queda do desemprego, aumento de postos de trabalho com carteira de trabalho assinada, mais de 90% das convenções coletivas conquistam reposições salariais e aumentos reais de salários - não é uma situação consolidada como podem pensar alguns. Há muita coisa a ser feita para consolidar a perspectiva de crescimento de longo prazo, condição necessária, mas não suficiente, para se enfrentar os graves déficits sociais presentes no país. Os ganhos das empresas, por exemplo, deve voltar-se para o investimento visando à ampliação da capacidade instalada. O aumento da produtividade possibilita elevar os salários e reduzir os preços e não somente engordar os lucros das empresas. Os impostos arrecadados, e o seu aumento com o crescimento econômico, podem promover a ampliação da capacidade de ação do Estado e possibilitar elevar a qualidade dos investimentos e dos serviços públicos. Esses são elementos da luta distributiva que é de longa duração e requer, para seu sucesso, o fortalecimento das organizações sociais, dos espaços e da capacidade de formulação de propostas e projetos, de espaços de negociação, de mecanismos de cobrança e monitoramento de efetividade. 

Esse desafio geral, analisado a partir da perspectiva do trabalho – do sujeito e do produto da sua ação – suscita desafios relevantes para avançar na consolidação das conquistas que a Constituição de 1988 trouxe. Esses desafios podem ser transformados em uma agenda sindical, em larga medida unitária. A seguir serão destacados alguns desses desafios.

a)     Considerar a questão do crescimento e da sua relação com o desenvolvimento como elemento central da visão estratégica de longo prazo que deve nortear as ações do movimento sindical, em especial nos espaços de negociação das políticas nacionais e transversais. Por um lado, criar as condições para o crescimento continuado requererá o fortalecimento da capacidade de investimento do estado e do setor privado, bem como recalibrar a política monetária incluindo as metas de crescimento, emprego e investimento como parte da sua missão. Participar ativamente do debate e da disputa das estratégias de longo prazo onde o trabalho tenha participação central é uma tarefa central do movimento sindical.

b)    O crescimento não se transforma em desenvolvimento por decorrência. Pelo contrário, em uma sociedade extremamente desigual como a brasileira, o crescimento agravará ainda mais nossas mazelas se a perspectiva distributiva não fizer parte da concepção que o orienta. Como existem graves distorções na distribuição da riqueza e renda no país, as difíceis escolhas que devem orientar o processo distributivo tornam-se mais complexas. Como os recursos são escassos e não possibilitam atacar simultaneamente todos os problemas, há que se fazer escolhas, que devem estar assentadas em sólidas análises técnicas, mas são essencialmente políticas. O movimento sindical deve ampliar sua capacidade política para atuar decisivamente nessas escolhas.


c)     Um exemplo da grande envergadura dessa relação entre crescimento e desenvolvimento foi recentemente colocado na agenda do país: trata-se das descobertas feitas pela Petrobras das reservas fósseis da camada pré-sal. Essa riqueza que a natureza nos deu e que o investimento tecnológico permitiu descobrir pode trazer outro patamar e ambiente para o crescimento do país. Qual será o destino que se dará a essa riqueza? Quais as escolhas que serão feitas? Quem as fará? Essa riqueza servirá para que poucos acumulem mais renda e riqueza ou para se alavancar outro patamar de crescimento e desenvolvimento do país e da nação? Somente um debate público vigoroso, orientado pelo radical interesse público de transformar essa riqueza em patrimônio da nação, a ser usado para possibilitar um salto no desenvolvimento do país, poderá tirar essa riqueza da sua privatização. Há uma tarefa urgente das organizações sociais, entre elas os sindicatos, de promover a publicização dessa questão e de chamar o poder público para esse debate, criando os mecanismos adequados para as escolhas e deliberações.

d)    Há vários elementos que devem ser colocados para dar suporte a uma nova relação entre crescimento e desenvolvimento. Um deles é considerar o trabalho uma dimensão constitutiva da estratégia de crescimento, que ganhará dimensão de desenvolvimento quanto mais o trabalho assalariado adquira a forma de emprego. Nesta forma o contrato social do país confere ao trabalha o direito à proteção durante e pós-vida laboral. Ao mesmo tempo, é necessário que o trabalho não assalariado (autônomo, contaprórpia, entre outros) adquira o mesmo status em termos de proteção social que o emprego confere ao trabalho assalariado. Portanto, a luta pela proteção social adquirida por homens e mulheres através do trabalho é uma das dimensões constitutivas da natureza do desenvolvimento e essência da ação sindical.

e)     proteção social que o trabalho gera através do emprego deve ser alargada na perspectiva da seguridade socialampla e universal. Nesta concepção é direito do cidadão o acesso ao trabalho e dever do estado criar as condições para tal. Em um conceito amplo, a seguridade social no trabalho exige uma política ativa de proteção e de promoção, tarefas que as políticas de intermediação de mão-de-obra, de seguro-desemprego, de qualificação social e profissional, de programas de geração de trabalho e rende devem permanentemente buscar e cumprir.

f)     Dimensões essenciais do desenvolvimento promovidas por uma estratégia de crescimento distributivo são aquelas que viabilizam as bases da homogeneização social: educação, saúde, habitação e transporte coletivo são essenciais para a qualidade de vida no trabalho, para a garantia e elevação da renda disponível, bem como, não menos importante, para a elevação do padrão médio de vida da classe trabalhadora.  

g)    Um desafio de grande envergadura é estabelecer o compromisso com as gerações futuras como parte central da estratégia de desenvolvimento. Nessa perspectiva são essenciais o investimento na política de educação, cujos investimentos continuados e de longo prazo geram mudanças na estrutura econômica e social, permitindo inclusive sustentar uma taxa de crescimento da produtividade média, elemento fundamental de um projeto distributivista.

h)    Ainda parte desse compromisso inter-geracional é a política previdenciária. As mudanças na perspectiva de vida, a queda da taxa de natalidade e suas conseqüências cruzadas, colocam para o sistema previdenciário desafios atuariais não desprezíveis. É necessário construir bases sólidas de projeção atuarial que permitam abrir um debate transparente sobre os compromissos da sociedade atual com a previdência do futuro.

i)      sustentabilidade ambiental é determinante para a qualidade de vida do futuro e, dadas as dramáticas alterações que o modelo de crescimento vigente têm promovido, condição Não sem pode deixar de destacar, ainda parte do compromisso com a zendo para o centro da visão de crescimento e desenvolvimento a sustentabilidade sócio-ambiental.

j)      desigualdade socioeconômica é hoje reprodutora eficaz do conjunto de desigualdades que caracterizam a sociedade brasileira. O território recepciona nas regiões essa matriz reprodutora de desigualdades. Um desafios estratégico é formular e disputar políticas de desenvolvimento regional capaz de acelerar o desenvolvimento de áreas historicamente excluídas.


k)    Na formulação de políticas de desenvolvimento local é de fundamental importância correlacionar políticas gerais com os projetos locais. Por exemplo, neste momento a Educação é uma prioridade da política pública federal com o PDE – Programa de Desenvolvimento da Educação. Esse programa se estrutura em Conselhos Municipais de elaboração e monitoramento de projetos de investimento para elevar a qualidade da educação no país a partir de cada território e escola. Articular a intervenção nos diferentes níveis faz parte das ações que podem levar ao sucesso. Outro exemplo, na mesma linha, é a criação de mais de duas centenas de Escolas Técnicas Federais. É reconhecida a capacidade que esses centros de educação tem como impulsionadores do desenvolvimento local pela capacidade que tem de elevar o conhecimento social aplicado e de incremento da produtividade, condições indispensáveis para o crescimento econômico. Participar de todas as etapas dessa política deve ser uma prioridade da ação sindical.

l)      organização sindical tem o desafio de modernizar-se com entidades cada vez mais representativas, em um ambiente institucional que favoreça e fortaleça a negociação coletiva, onde os conflitos tenham solução ágil, com o direito de organização garantido desde o local de trabalho e pleno direito de greve. Há no Congresso Nacional um projeto de reforma sindical elaborado no âmbito do Fórum Nacional do Trabalho, criado pelo Ministério do Trabalho e Emprego e que, entre 2004 e 2005, elaborou em mais de 500 horas de negociações tripartite, uma proposta de reforma sindical que visa responder as questões acima. Um dos desafios é fazer esse projeto ter seguimento legislativo, debatendo-o e o alterando-o no que for necessário.

m)   O governo federal nos últimos anos ampliou o número de Conselhos que tratam dos mais variados temas. Em muito casos, esses Conselhos se articulam a partir de Conferências Nacionais, precedidas de conferência locais, que debatem e propõem políticas setoriais. Saúde, educação, educação profissional, segurança alimentar entre tantas outras já se estruturaram dessa maneira. Um dos desafios é garantir uma participação de qualidade nesses espaços, seja na formulação das políticas públicas, no seu monitoramento e acompanhamento, na avaliação, bem como na difusão das decisões tomadas, permitindo que a política chegue nos territórios específicos.
n)    Outro exemplo dessa participação é a recente regulamentação da participação das entidades sindicais nos Conselhos de Administração do Senai e do Senac. Uma antiga reivindicação foi contemplada. Garantir que a participação eleve a qualidade do atendimento da demanda de qualificação dos trabalhadores é um dos desafios nessa participação.

o)    informalidade do trabalho atinge quase metade da força de trabalho. O caso é mais grave no campo, mais nas regiões metropolitanas mais de 1/3 dos trabalhadores não têm carteira de trabalho assinada. A informalidade significa a exclusão dessa população da participação e acesso ao sistema de proteção social, durante a vida de trabalho (diante do acidente de trabalho, por exemplo) e pós vida laboral, viabilizando a aposentadoria. Há uma série de ocupações que não são assalariadas típicas – trabalho autônomo ou por conta-própria – que, apesar de regular, não tem instrumentos adequados de participação contributiva à renda e à condição de trabalho.

p)    emprego doméstico envolve mais de 7 milhos de trabalhadoras (mais de 95% são trabalhadoras), mais de ¾ na informalidade. A relação de emprego com uma família, apesar de ser uma relação de trabalho, não pode ser comparada à relação com uma empresa. Desenvolver as condições e os instrumentos que favoreçam e protejam esse emprego é uma tarefa de grande envergadura.

q)    terceirização desenvolveu-se na sua forma mais perversa através da criação de empresas de intermediação de mão-de-obra. Além disso, muitas situações de terceirização foram implantadas com o objetivo de reduzi custos, o que significa precarização das condições de trabalho e remuneração. A fragmentação da representação sindical acaba favorecendo essa situação na medida em que separa a representação daqueles que trabalham no mesmo espaço da mesma empresa. Um dos desafios é garantir a representação sindical independente da empresa contratante, bem como impedir todo tipo de intermediação de mão-de-obra.

 Os desafios poderiam continuar a ser relacionados, pois há uma agenda muito grande de questões que demandam enfrentamento. Um dos grandes desafios é desenvolver um tipo de organização sindical capaz de fazer frente a estes desafios. Qualquer que seja a mudança necessária na vida sindical, a mobilização social será sempre fator decisivo para o enfrentamento político nas diferentes lutas sociais. Mas a experiência democrática mostra também que essa intervenção, que no geral começa como um demanda, avança nos mais variados espaços de luta e negociação, para uma situação de proposição. Isso significa que a superação da necessidade ou da demanda precisa de propostas ou projetos e estes, dependem também da capacidade de elaborá-los. A luta tornou-se mais complexa e mais desafiadora.






[1] Sociólogo, Diretor Técnico do DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, membro do CDES – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e do Conselho de Administração do CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos.

       [2] “20 anos da Constituição Federal de 1998: os Direitos Trabalhistas”, roteiro da palestra de Artur Henrique da Silva Santos, Presidente Nacional da CUT, outubro  2008.


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