INOVAÇÃO E TRABALHO: A NEGOCIAÇÃO COLETIVA REGULANDO AS RELAÇÕES DE TRABALHO EM CONTEXTOS DESRUPTIVOS
INOVAÇÃO E TRABALHO: A NEGOCIAÇÃO COLETIVA REGULANDO AS RELAÇÕES DE TRABALHO EM CONTEXTOS DESRUPTIVOS
DIRETRIZES PARA O PLANO NACIONAL DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO
Clemente Ganz Lúcio[1]
Julho de 2024
Inovar para viver melhor. Como princípio de uma política e de um plano de governo, a inovação é a essência de um sistema produtivo pujante e o centro de uma estratégia de desenvolvimento para gerar um modo bom de viver para todos, com bons empregos e salários.
As desigualdades são gravíssimos problemas que bloqueiam, para a maioria, um modo bom de viver, reproduzem iniquidades e injustiças e travam a capacidade do país e da nação de alcançar um adequado patamar de desenvolvimento coletivo.
A maior parcela da sociedade se posiciona no sistema produtivo como trabalhadores, com seus interesses. Quais são esses interesses? Ter acesso a bons empregos, com bons salários, com proteções sociais, previdenciárias e trabalhistas. Para as empresas, interessa a produtividade, a qualidade e a rentabilidade do investimento.
No contexto da relação entre produtividade, inovação e emprego, observa-se que a manufatura emprega cada vez menos e os empregos se deslocam para o amplo setor de serviços. Em todo o sistema produtivo, as inovações tecnológicas trazem mudanças disruptivas para o mundo do trabalho, atingindo todos os postos de trabalho em todos os setores. A formação profissional adquirida se esgota rapidamente, a insegurança no emprego prevalece, a precarização do trabalho se alastra e o medo, a ansiedade e o estresse passam a ser o novo normal de uma força de trabalho adoecida. Parece que cada vez mais nos afastamos do ideal em que a inovação tem por objetivo gerar bons empregos produtivos para todos. Abrem-se altos riscos de desemprego estrutural de longo prazo.
Nos territórios, a pobreza gera obstáculos à transformação estrutural, e as inovações passam longe da apropriação local para mudar a situação vivida e o padrão de desenvolvimento.
As mudanças na propriedade do capital, para fundos de investimentos cada vez mais poderosos, alteram as dinâmicas da reprodução do capital, incluindo objetivos de redução permanente do custo do trabalho e novos tempos e métodos de distribuição de resultados, favorecendo a concentração de renda e de riqueza e fragilizando os investimentos. Isso inclui inovação para eliminar postos de trabalho; impactos tecnológicos sobre o mundo do trabalho sem nenhuma mediação dos sindicatos; fragilização da negociação coletiva como instituição reguladora das relações de trabalho; e enfraquecimento intencional da capacidade dos sindicatos de exercerem a representação coletiva de interesses.
Os empregos de qualidade fizeram parte da essência das políticas de coesão social que estruturaram as democracias no pós-guerra. A regulação da distribuição do produto do trabalho combinou legislação e contratação coletiva.
Os sindicatos são formações institucionalizadas de representação de interesse coletivo habilitados nas democracias a promover, por meio da representação na negociação coletiva, a regulação das condições de trabalho e a distribuição do produto econômico gerado pelo trabalho na forma de salário direto e indireto e diferentes tipos de direitos.
Para responder aos desafios apresentados, indicamos sete diretrizes para o Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação a partir da perspectiva da relação entre trabalho e inovação.
Diretrizes
- O desenvolvimento produtivo deve combinar reindustrialização, inovação, digitalização e transição verde justa com a geração de bons empregos e ocupações para todos e transformações estruturais nos territórios pró-igualdade.
- Todas as formas e dimensões da inovação, em um plano de governo, devem ser acompanhadas da intencionalidade de gerar bons empregos e ocupações para todos, com especial atenção aos trabalhadores com menores qualificações, combinando o objetivo de incremento da produtividade do trabalho em todos os setores com mudanças nos territórios.
- Os impactos e resultados das múltiplas inovações sobre o mundo do trabalho devem ser regulados prioritariamente por meio das negociações coletivas, realizadas pelas representações das partes interessadas, materializadas em acordos coletivos e convenções coletivas de trabalho, cabendo à legislação garantir os marcos referenciais dos direitos e das proteções.
- O plano nacional de ciência, tecnologia e inovação deve ser materializado em Planos Locais de Inovação, visando gerar inovações que favoreçam as transformações estruturais locais consonantes com os objetivos estratégicos de desenvolvimento da região e do país.
- Estabelecer a integração entre o sistema de inovação, a Política Nacional de Educação Profissional e Tecnológica e a Lei do Novo Ensino Médio.
- Considerar a educação profissional capacitadora para a inovação como um direito permanente que se desenvolve durante toda a vida laboral, com oferta regular, normatizada na lei e na negociação coletiva, de acesso universal.
- Criar o Observatório do Emprego, Inovação e Produtividade.
[1] Sociólogo, coordenador do Fórum das Centrais Sindicais, membro do CDESS – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável da Presidência da República, membro do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil, membro do Pacto de Combate às Desigualdades, consultor e ex-diretor técnico do DIEESE (2004/2020).
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