Inflação e custo de vida: por que os números não condizem com a percepção da realidade
Inflação e custo de vida: por
que os números não condizem com a percepção da realidade
Clemente
Ganz Lúcio[1]
Em 2017, enquanto o governo comemorava a
inflação média acumulada de 2,95%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor
Amplo, calculado pelo IBGE, resultado muito abaixo da meta estipulada de 4,5%,
o consumidor reclamava que os números eram manipulados pelas instituições que
os calculavam, que os preços estavam altos e que havia, sim, aumento no custo
de vida.
É importante considerar, antes de tudo, que a
inflação é calculada com base em uma cesta média da população da localidade a
que se refere o índice. Com base nesta cesta, acompanha-se, mensalmente, a
variação dos preços destes bens, e, de acordo com o peso de cada item,
calcula-se a taxa mensal. Nem sempre a cesta média é igual à do conjunto de
bens consumidos por uma determinada família. Por exemplo, se uma família
específica não possui carro, o preço do combustível não faz parte do seu
orçamento, mas é um item componente da cesta média pesquisada pelos vários
institutos que calculam a inflação. Assim, a inflação média divulgada pode ser
maior ou menor do que a inflação de uma determinada família. Há, porém, por
trás dos números, muito mais do que a composição da cesta.
Em 2017, os alimentos foram os itens que mais
diminuíram de valor e o motivo foi a excelente safra do ano. Realmente, os
preços dos bens alimentícios mostraram retração no ano passado; no entanto, em
2015 e 2016, os valores médios de alimentos básicos como leite, carne, feijão,
manteiga, queijo, frango, entre outros, tiveram trajetória altista,
principalmente devido às variações climáticas, e atingiram patamares muito
elevados. Por exemplo, o feijão carioquinha que, em 2016, chegou a ser
reajustado em mais de 50% em alguns meses do ano, ao normalizar a oferta, não
diminuiu o preço ao valor do início do ano. De forma que, em 2017, os recuos
aconteceram, mas não foram suficientes para colocar as cotações em patamares
próximos aos registrados em 2014.
Além disso, os preços dos bens chamados administrados,
como água, luz, gasolina, álcool, gás de botijão, entre outros, foram
reajustados muito acima da taxa média do ano. Segundo o Índice de Custo de Vida,
calculado pelo DIEESE, enquanto a taxa média do ano foi de 2,44%, o conjunto de
preços administrados variou mais de 6,00%. Vale destacar ainda que os bens
administrados são essenciais para todas as famílias, e têm peso maior no
orçamento doméstico das famílias de menor renda: quando as contas de água, luz
e gás, não são pagas, os serviços a elas relacionados são cortados e a família
fica sem refrigeração para os alimentos, sem televisão, sem banho, sem a
possibilidade de cozinhar. Assim, grande parcela da renda das pessoas ficou
comprometida no pagamento das contas de serviços básicos.
Existem ainda os bens oligopolizados, que são
produzidos por grandes indústrias. O reajuste de alguns de seus segmentos, como
o dos remédios, possui regulação do governo, mesmo assim, apresentaram elevação
de preços no patamar de 6,00%, segundo o cálculo do DIEESE, superior à inflação
média acumulada.
O outro lado do problema está no decréscimo da
renda das famílias. Desde 2014, o país vivencia a redução no crescimento da
economia, a diminuição das ocupações, a elevação do desemprego, o aumento da
informalidade e a queda nos rendimentos.
Por um lado, os preços dos bens livres, como
alimentos básicos, atingiram alto patamar de valor e o recuo não foi suficiente
para reduzir o preço final ofertado ao consumidor; e ainda, os bens essenciais
ou administrados estão sendo reajustados muito acima da média da inflação. Por
outro, as famílias brasileiras vêm perdendo renda e poder aquisitivo.
A percepção geral da sociedade brasileira é
que, hoje, os itens básicos estão muito caros e o rendimento mensal possibilita
cada vez a compra de menos itens. Resumindo, houve o empobrecimento das
famílias, principalmente, as de baixa renda e, não há como comemorar os
resultados da inflação em 2017.
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